'' e a vida era mesmo assim: cair sete vezes & levantar oito. ''

segunda-feira, 11 de junho de 2012

; regresso





 Lauren ouviu baterem à porta. Rapidamente largou a sopa que estava a fazer para o seu jantar e foi ver quem era. O seu coração, literalmente, parou ao ver o seu marido. Os seus olhares cruzaram-se e ambos começaram a chorar. Ainda atordoada, Lauren resolveu ir chamar o filho. Durante esse compasso de espera, atrapalhadamente, agarrou no seu telemóvel e digitou o número que já sabia de cor. Sem mais demoras, escreveu em letras maiúsculas vivas: NÃO VENHAS HOJE JANTAR, O ROGER VOLTOU.
 Desde nova, Lauren havia-se apaixonado por Roger; praticamente era impossível separá-los. Já em crianças, Roger andava com a sua amada pela rua fora, de mãos dadas, e toda a gente achava uma gracinha, mesmo não sabendo que aquela relação seria, ao que dava-se a entender, para além do efémero. Certo é que a relação fora evoluindo: Roger e Lauren casaram, conceberam um filho e tinham tudo para ser o casal mais feliz.
 No entanto, o karma não parecia satisfeito. O tempo que Roger e Lauren haviam passado juntos, o destino fez questão de compensar. Roger tornara-se membro da marinha e viajava para lugares longínquos a combater o terrorismo em nome da pátria. Assim, Roger apenas regressava a casa de quando em quando e esse quando podia-se alongar até dois anos.
 É claro que não condeno e ninguém é digno de acusar, mas o certo é que Lauren, num dos dias em que passava a chorar, encontrou Michael e ambos começaram a ter um relacionamento, fazendo dele o seu amante.
 Agora, passado alguns anos e sem avisar, Roger havia regressado e encontrava-se agarrado ao filho que ele mal conhecera. Lauren disfarçou o facto de estar incomodada com a presença e perguntou ao seu marido se estava com fome.
 A lua começara a subir a uma velocidade incrível e a noite pós-estival ia-se adiantando com alguns clichés e sorrisos forçados e, quando Lauren percebeu que já não dava mais para continuar com aquela encenação, mandou o seu filho dormir.
 - Mãe? – sussurrou Tom, o seu filho que já tinha catorze anos. – O pai não sabe do Mike, pois não?
 Lauren acenou para Tom subir as escadas e o filho obedeceu. Por um segundo que foi equivalente a umas boas horas, as perguntas que Lauren receava mais suscitaram: ‘’Conto?’’ ‘’Não conto?’’ ‘’Se contar, o que vai acontecer ao Tom? ‘’ ‘’Se não contar, que raio de mulher sou eu?’’. Ainda com a cabeça cheia de interrogações, voltou-se para Roger e andou de mansinho. Sentou-se no seu colo e fez com que os seus braços fortes a agarrassem. Murmurou ao seu ouvido:
 - Quanto tempo vais ficar desta vez?
 - Só esta noite, depois volto. Fizeram-me uma proposta que não posso recusar. Não faças essa cara, é por uma boa causa. É para o futuro do Tom.
‘’Sim, e o nosso futuro?’’ pensou Lauren, mas teve medo do poder da sua pergunta e não teve coragem para a formular.
 Roger começou a beijar os lábios dela enquanto afastava os seus cabelos negros. Depois, pegou nela e foram, ainda um pouco destreinados, em direção ao seu quarto. Roger atirou Lauren para cima da cama e tentou compensá-la pelo tempo perdido.
Lauren pensava que sexo não era capaz de compensar o tempo em que fora vista, pelo bairro, como a casada cujo marido só a visitava de ano em ano, pelo tempo em que fora a jantares entre casais sozinha, pelos aniversários em que apenas festejava com o filho, pelas noites em que passara sozinha. Michael havia surgido na altura certa e estava presente, era capaz de a ajudar em tudo, ao contrário de Roger que apenas a visitava por um ou dois dias e só lhe conseguia dar sexo. Entre pensamentos e gemidos de satisfação por parte de Roger, Lauren acabou por adormecer.
 O relógio pousada na mesinha de cabeceira do lado onde Lauren dormia deu as seis horas. Roger limitou-se a sair da cama, beijar a testa da sua esposa e dirigir-se ao quarto de Tom. Contemplou as sombras que os objetos faziam quando eram inundados pelos ainda fracos raios da manhã. Depois olhou para o seu filho e verteu algumas lágrimas. Alisou o despenteado cabelo do filho, provavelmente fruto duma noite de muita agitação, e sussurrou em surdina: ‘’Isto é por ti, filho. Desculpa. ‘’. Por fim, vestiu-se e desceu as escadas. Contornou a torneira enquanto pensava no tempo perdido com Tom. Não havia sido um pai presente, não o havia levado à escola no primeiro dia, não o ajudara a estudar, não passara com ele inúmeros aniversários, não conhecia nenhuma das suas amigas nem sabia se o filho alguma vez namorara. Pela primeira vez, pensou em desistir de ir. Porém, essa dúvida desfez-se rapidamente ao pensar que teria de ter boas condições para criar o filho. Fez para si um pacto: aquela seria a última missão, a última vez que os abandonava.
 Queria contar a Lauren, mas não a queria acordar, visto que ambos odiavam despedidas. Portanto agarrou num papel e escreveu, com uma caligrafia um pouco apressada: ‘’Voltarei em breve e voltarei de vez. ‘’. Feito isto, Roger olhou uma última vez para a casa e foi-se embora.
 Passaram-se alguns meses e Lauren ainda aguardava notícias de Roger. Recebeu Michael em casa e chamou o filho para almoçarem. Tom ficara desapontado com a ida do pai. Já não tratava a mãe da mesma maneira dócil e culpava Michael por tudo. Tom não conseguia almoçar, apenas remexia os bocados de comida no seu prato.
 - Tom, filho, come senão a lasanha fica fria.
 Lauren fora interrompida para televisão: ‘’Mais de cem militares da nação morreram esta manhã nos confrontos contra o Leste. Prestemos uma homenagem aos militares cujos corpos foram encontrados mortos’’ e passou imagens de cada um dos soldados. Lauren deixou cair o copo que estava na sua mão e Tom ficou perplexo a olhar para a TV, assim como Michael. Roger havia morrido.
 Lauren ausentou-se da cozinha e Tom começara aos berros. Michael ainda tentara acalmar Tom, mas era impossível. Lauren não parava de chorar e agarrou numa fotografia do seu marido. Pensou para si como tinha sido egoísta ao ponto de não esperar por ele, por ter ficado com Michael e não ter contado a Roger. E agora Roger estava morto e não havia maneira de voltar atrás e desmanchar o passado.
Passado alguns dias, Lauren decidiu que acabar a sua relação com Michael seria o melhor. Mike não se opôs e compreendo a atitude tomada pela sua amada.
O Sol começou a tornar-se mais forte. Era primavera de novo. Lauren acordou e pôs uma flor no jarro que ficava na sua mesa-de-cabeceira. Fazia isto desde que Roger havia partido e já lá iam alguns meses. Naquela manhã, Tom chegou ao quarto da mãe. Com alguma vergonha, deitou-se no lado onde o seu pai dormia e abraçou Lauren.
 - Mãe? Acho que devias voltar para o Mike…
 - Que disparate filho! Tu até estavas chateado com ele! Porquê isso agora?
 - Porque ele sempre foi o pai que eu nunca tive, porque sempre foi o único homem que te dava amor. Ele amava-te e tu também o amavas. É estúpido, vocês não ficarem juntos.
 - Eu cometi um erro em andar com o Michael. Nunca deveria ter acontecido.
 - Eu não te culpo por traíres o pai, muito menos pela morte dele. Tu tentaste o impedir. Tu mereces ser feliz por todos estes anos. Mas pronto, conversas isto com o Mike. Ele deve estar a chegar para tomar o pequeno-almoço contigo, eu convidei-o por ti.
 - Tu quê?
 Tom retirou-se do quarto. Sabia que havia feito o correto. A mãe sempre fazia o melhor para ele e ele tentou fazer o melhor para a mãe.
 Quando Michael chegou, Lauren não sabia o que dizer e ele percebeu disso. Correu para ela e abraçou-a.
 - Desculpa por tudo, Mike!
 - Não sejas tonta, eu amo-te. Tu sabes disso.
 Lauren e Michael ficaram abraçados nas escadas, enquanto, do céu, o Sol iluminava as flores que Lauren punha em homenagem ao seu ex-marido.

5 comentários:

  1. simplesmente fantástico!
    tens mesmo muito jeito para escrever, as tuas palavras fascinam-me.
    Vou ficar a espera do próximo post, tenho a certeza que esse vai ser tão bonito como este *-*
    Beijinhos e continua a escrever, SEMPRE!

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    1. obrigado a sério. nem sabes como essa opinião me fortalece!
      obrigado mesmo muito por todo o apoio! *.*

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    2. não agradeças, não gosto que as pessoas me agradeçam quando digo a verdade.
      Conto com a continuação da tua inspiração escrita aqui, no teu cantinho :)

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  2. Olá, sou a Diana, sigo o teu blog á pouco tempo, este foi o primeiro texto que li e ouve-me tá perfeito, tá soberbo, continua, estarei cá para ler os próximos.

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